Ainda há esperança!
É manhã de uma segunda-feira. Os primeiros raios de sol
despontam no horizonte e o alarme insistente do celular me convida à ação.
“Vamos, Graça, ânimo! Hora de levantar!” – é o que me recomenda o bom-senso,
embora o corpo cansado convide a ficar “só mais um pouquinho”. Não entendo por
que já estou cansada se ainda é segunda-feira, mas logo chego à conclusão: é
uma segunda de muitas “segundas” de um ano que, por sua vez, é mais um de vinte
dedicados à docência. É o desgaste natural que o passar do tempo provoca,
trazendo junto com ele, positivamente, um pouco mais de serenidade e
equilíbrio. Sorrio. Levanto cantarolando um trecho da bela canção de Frejat:
“Desejo que você tenha a quem amar/ E quando estiver bem cansado/ Ainda, exista
amor pra recomeçar...” E é renovada por
esse amor à profissão, ao desejo de fazer a diferença, mudar e mudar-me a cada
dia, que inicio mais uma jornada dupla de trabalho – são trinta e oito aulas
semanais, lecionando Língua Portuguesa para turmas do Ensino Fundamental e
Médio, na Escola Estadual “Deputado Patrus de Sousa”.
Nesses últimos dias, ando deveras feliz. O artigo de
opinião produzido por uma de minhas alunas do 3º ano é semifinalista da
Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro. Pequenas conquistas que nos
enchem de orgulho e esperança. No trajeto que faço, a pé, para a Escola, um
filme passa na minha cabeça. E volto ao ano de 2008, em que nossa Escola
participou da primeira edição da Olimpíada. Naquela ocasião, classificamos um
texto do gênero memórias literárias para a etapa estadual. Em 2010, nossa
adesão ao movimento grevista da categoria inviabilizou a participação da Escola
na 2ª edição da OLP.
Esse ano, não poderia deixar a oportunidade passar, pois já
havia experimentado o gosto gratificante de ver meus alunos escrevendo e
aprimorando seus textos a partir das sequências didáticas estudadas. Em meu
Plano de Gestão de Desenvolvimento Individual, sempre incluo a participação na
OLP como ação a ser desenvolvida e como estratégia de ensino. Vejo, entretanto,
que nem todos os docentes enxergam, ainda, a grandiosidade do Projeto e, como
consequência, não aderem à proposta. Assim aconteceu na minha Escola, em que,
dos seis professores de Língua Portuguesa, apenas três participaram. Não podemos,
obviamente, culpá-los, pois a sobrecarga de trabalho é grande, as cobranças são
muitas e os recursos, poucos (até mesmo para xerox). Senti-me, assim, um tanto
quanto só nessa jornada. Mas, cheia de ânimo e coragem, iniciei os trabalhos
com as cinco turmas de 3º ano para as quais leciono.
Ao levá-los a proposta da participação na Olimpíada,
perguntei quem já conhecia o Projeto, ao que a maioria dos alunos respondeu
positivamente, embora não soubessem muito bem como os trabalhos seriam
desenvolvidos, pois faziam uma associação com a Olimpíada Brasileira de
Matemática das Escolas Públicas, em que realizam provas. Expliquei-lhes que a
Olimpíada de Língua Portuguesa tem como objetivo principal melhorar as práticas
de leitura e escrita dos alunos e que, para isso acontecer, trabalharíamos com
a sequência didática proposta no material a nós enviado. Esclareci que a etapa
final dos trabalhos seria a produção de um artigo de opinião individual, sobre
uma questão polêmica local e relevante.
Para a produção do primeiro artigo de opinião, debatemos em
sala de aula temas polêmicos propostos pelos próprios alunos, tais como:
“Aborto de anencéfalo – a favor ou contra?”, “Sistema de cotas nas
universidades – solução ou paliativo?”. Posso dizer que os debates renderam bons
momentos de trocas de ideias em que os alunos puderam expor seus pontos de
vista, embora muitos não conseguissem apresentar argumentos consistentes.
Estimulei-os a buscarem os porquês, as causas e as consequências das posições
que defendiam, às vezes de forma veemente, provocando reações acaloradas dos
que pensavam de forma diferente. Como mediadora, procurava serenar os ânimos e
fazê-los entender que num debate de ideias não vence quem fala mais alto, e sim
quem tem os melhores argumentos. A partir daí, cada um produziu seu texto sobre
o assunto debatido na classe. Esse primeiro texto serviu de diagnóstico e pude detectar
as principais dificuldades dos alunos na produção de um artigo de opinião.
Constatei a limitação de muitos em apresentar argumentos válidos e variados,
bem como em usar adequadamente os elementos articuladores.
Para que pudessem melhorar seus textos, as oficinas que se
seguiram foram de grande importância, pois possibilitaram o conhecimento mais
aprofundado desse gênero textual, trabalhando com conceitos como: questão
polêmica, tese, argumentação, contra-argumentação, elementos articuladores e
vozes. Nessa etapa, escolhi alguns artigos de alunos finalistas da OLP/2010
para trabalharmos em sala de aula, pois considerei que seria uma forma de
incentivá-los e mostrar que eles também eram capazes de produzir bons textos.
Cumpre ressaltar a riqueza do material apresentado no sítio da Olimpíada, mas
também a dificuldade que tive em utilizá-lo, pois nossa Escola dispunha de um
laboratório de informática limitado – que agora está sendo ampliado – e o único
projetor que possuíamos foi roubado. Diante dessas limitações, muitas vezes
tive que improvisar, passando as atividades na lousa ou fazendo cópias do
material. Com o decorrer das oficinas, pude perceber que o entendimento dos
alunos sobre o gênero ia sendo ampliado. Interessante era ouvir deles
comentários como: “Escrever um artigo de opinião é muito legal, mas dá um
trabalho!”, ou “Se comparar os meus textos do ano passado com os deste ano, dá
para perceber o quanto eu evoluí.”
Chegado o momento da escolha da questão polêmica para a
produção do artigo de opinião, várias foram as sugestões, mas uma, em especial,
atraiu a atenção da maioria: a disputa política em nosso Município, que é algo
“sui generis”, pois a cidade se divide em duas e se torna palco de uma
verdadeira guerra verbal. Pronto! Estava definido o tema! Feitas as pesquisas,
socializados os resultados, os alunos produziram seus textos e, após escritas e
reescritas, demos por encerrado os trabalhos, que culminaram com a escolha do
texto da aluna Samara para representar a nossa Escola na Olimpíada. Posso
considerar que, excetuando os que nem quiseram tentar, – infelizmente, há, devo
confessar – recebi muitos textos que, se não perfeitos, mostravam avanços.
Hoje, já se aproximando o dia de viajarmos para o Encontro
Regional, em BH, fica a certeza de que vale a pena buscar o diferente e o novo,
ainda que isso possa nos trazer instabilidade e, às vezes, o desejo de
desistir, de se fechar no casulo e não dar chance à borboleta. Projeto como o
da Olimpíada de Língua Portuguesa tem o seu diferencial, pois colabora para o
crescimento não só do educando, mas do profissional da educação pública, tão
desprestigiado e desvalorizado, tendo que exercer jornadas duplas ou até
triplas de trabalho para ter uma (sobre)vivência digna, honrada. Que venham
outras edições!
Maria das
Graças Nogueira
Samara e eu - no alto, faixa enviada à Escola pelo CENPEC (organizador da OLP). |